As peripécias deste desconfinamento parecem indicar que a abertura de portas foi muito mais desleixada do que o seu fechamento. Todas as importantes e persistentes instruções de meados de Março e do início do confinamento resultaram, porque foram claras e precisas; no desconfinamento, aconteceu o contrário - pior comunicação, instruções mais difusas, menos preparação, menos acompanhamento, decisões contraditórias, mudanças de rumo frequentes - que ainda por cima é o que pode gerar maior desconfiança e perturbação, até na actividade económica. No final de Maio, as pessoas estavam saturadas e era previsível que, a menos que tudo fosse muito salvaguardado, ocorreriam excessos. É dever de quem manda prever este tipo de coisas.
Da mesma maneira que elogiei a persistente acção do Governo no confinamento e a forma como Costa acompanhou a situação, desta vez junto a minha voz a todos os que apontam o dedo aos dislates das últimas semanas. Já nem falo da triste cena da cerimónia de regozijo pela vinda da Champions, nem da ofensiva ideia de que aumentar o perigo era uma homenagem ao pessoal da saúde, nem das ridículas posições de Fernando Medina, que, durante os piores momentos, não se ouviu nem se sentiu e que agora quer cantar de poleiro. Cito o que Ana Cristina Leonardo escreveu esta semana, na sua página do Facebook: "Numa situação como a que estamos a viver, onde por muito cuidado que se tenha não existe risco zero, o inimigo é invisível à vista desarmada e o país é mesmo muito pobre, o equilíbrio entre economia e saúde pública vai ser - está a ser - difícil de gerir (...). E ter autoridade numa situação de crise conta bastante." Foi essa autoridade que se perdeu neste recente e acidentado percurso. O poder é um vício, que por vezes embebeda e faz perder a noção da realidade, sobretudo quando os "cocktails" são servidos, como tem acontecido ultimamente, pelo próprio Presidente da República, em constantes "happy hours" com o primeiro-ministro.
Manuel Falcão, JN
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