“Tudo” iria mudar. E mesmo que ninguém atendesse a que o “tudo” era confuso e difuso, que importava: “começava uma nova era na Europa”; “acabava a austeridade”, “agradeçamos aos gregos”. Não durou uma semana e chegou a ser embaraçante.
O clamor de raiva e revolta que Tsipras queria audivelmente grego por esse Europa fora e por essa Alemanha dentro, esvaiu-se na sua própria irremediabilidade: em lugar da rendição da “Alemanha” e do seu titular das Finanças travestido de nazi, o Syriza obteve a “compreensão” bem educada mas não inédita de uma mera prorrogação de prazos (Portugal também obteve, mas com menos barulho) e um divertido vocabulário novo: a “austeridade “ passa a chamar-se “as dificuldades que hão-vir” (Varoufakis dixit) e a troika é agora conhecida nos corredores de Bruxelas como “the three institutions formerly known as the troika”. Etc. Mas não interessa muito, são só palavras e o “ponto” é uma realidade que se resume em duas palavras: a Grécia tem zero capacidade negocial.
De modo que a vida (de momento) seguirá como “habitualmente”, permanecem regras e compromissos e aí não houve semântica que movesse um cabelo. Vai ser preciso um génio da encenação para fazer crer aos gregos que a vida que os espera será muito diferente da que lhes proporcionava o ex-Samaras. De ficção em ficção, até á derrota final. (esta história não pode acabar bem). E isso sim, isso é que constitui uma falta de respeito sem tamanho pelo povo grego, isso sim é uma indignidade face às condições de aflição em que reside grande parte dele, isso sim é uma afronta face aos que não tem voz nem meios. Aos que votaram Syriza e aos que não votaram: a bandeira do engano é a mesma.
Maria João Avillez, Observador
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