A transmissão directa dos debates (...) em particular, das comissões parlamentares de inquérito tornou-se, ela própria, um instrumento favorável ao acirrar das tensões e ao extremar de posições. O foco de qualquer discussão deixa de ser o tema em si mesmo para passar a ser o floreado circense destinado a impressionar e a mobilizar emocionalmente a plateia, envolvendo-a no processo e levando-a a reagir por instinto primário e com isso condicionar o adversário. Agitando as emoções e encandeando com elas a razão, estimula-se inevitavelmente a belicosidade e a radicalização de posições, favorecendo as dicotomias do "nós contra eles", e com isso se vai esfiapando a coesão indispensável à estabilidade de que depende a boa ordem e o bem-estar sociais. Não deixa de ser paradoxal, mas não surpreendente, que a transparência no funcionamento da vida política, usada como argumento justificativo de uma tal evolução, acabe por produzir resultados contrários àqueles que visa alcançar. Para já não falar da contradição maior - mas que não cabe desenvolver aqui hoje - de que a essa maior transparência processual acabe por corresponder muitas vezes a persistente obscuridade com que se insiste em proteger conteúdos essenciais à necessária responsabilização política.
Vitor Bento, DN
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