A dimensão dramática, psicológica e social dos trans, transgén eros e transexuais pode ser adivinhada por quem conhece o lado mesquinho da sociedade - e os próprios não a adivinham, sofrem-na. O Estado, que fez uma lei, deveria dotar-se de medidas para as fazer cumprir. Não acontecendo estas, avançou-se com um salto em frente.(...)
E depois?, disseram-me amigos. E depois, eu disse-lhes, ser homem ou mulher faz sentido e os nomes, de homem ou de mulher, também. Têm sentido e carregamo-los não sei onde. E andei por 36 formas de dizer isto, quando me decidi por esta: não quero que os títulos de livros mudem porque ser homem ou mulher e os nomes, de homem ou de mulher, deixaram de fazer sentido.
Não quero chegar ao dia em que Romeu e Julieta se chame "Seres Humanos". E que O Primo Basílio seja "Parente em Quarto Grau". E que Tio Vânia, de Anton Tchekhov, seja o único a manter o título por causa da sua ambiguidade. E A Mãe, de Gorky não o queria "Progenitor sem Próstata". E que Lolita continue assim, sem precisar que Dolores Haze, que só tem 12 anos, chegue aos 16 e decida qual o género a que pertence. E que O Segundo Sexo, da Beauvoir, assim se mantenha apesar das contas curtas. E continue O Amante de Lady Chatterley, apesar de inspirado na verdadeira Lady Ottoline Morrell, que além do citado amante proletário teve vários outros e outras de várias classes. E que Os Maias não prolongue o título para "Os Maias (Incluindo Maria Eduarda)", para cumprir as quotas de género. Para compensar Eça, a vida tal como ela se vai fazendo já se tinha encarregado disso com Menina e Moça, de Bernardim Ribeiro.
Eu não queria que o Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, em que se fala das engenharias de alma, viesse, com justa causa a ter por título "O Registo Civil". E, sobretudo, queria que ele fosse lido, para não cairmos em erros há muito avisados.
(Excertos do artigo de Ferreira Fernandes, DN)
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