sábado, 15 de agosto de 2020

O Impacto Da Covid-19 No SNS

Nos últimos meses, os profissionais de saúde – em tempos heróis com honras de palmas às janelas – transformaram-se no depósito da frustração de utentes desesperados pelas falhas no acesso a cuidados de saúde. Passaram de bestiais a bestas. Precisamos de perceber o motivo desta viragem: um SNS já de si deficiente, que ficou Covid-19 dependente.

Ao contemplar diariamente as filas à porta dos serviços, o barulho incessante dos telefones, a azáfama de registos redundantes e de tarefas obtusas e a redução do horário de algumas unidades de saúde por falta de profissionais, é fácil perceber que algo vai mal. 

João Júlio Cerqueira e Nuno Silva , OBSR

A questão de fundo mais relevante que podemos colocar, neste momento, é “o que vai acontecer no outono e no inverno?”

Suspenderemos os rastreios, os doentes crónicos continuarão com um seguimento abaixo do padrão habitual e os centros de saúde e os hospitais permanecerão abertos? Os soldados da linha da frente nesta guerra biológica vão ficar nas trincheiras, enquanto a população morre de doenças extra Covid-19, seja pela ausência de resposta ou pelo medo da procura?

Temos de aceitar que, pelo menos até haver vacina, vamos continuar a conviver com o vírus. Logo, o que faz sentido é ter serviços de saúde capazes de dar resposta aos doentes e de divergir de uma rota Covid-19 dependente, com profissionais agrilhoados pelos números diários que de nada servem porque em nada resultam. Substituindo a propaganda pela estratégia, é possível usar “os números da pandemia” na definição de níveis de risco inteligíveis para as diferentes áreas do país, com limitações proporcionais à realidade objetivada. De outro modo, arriscamo-nos (caso já não esteja a acontecer) a que as pessoa não morram com Covid-19, mas somente por causa da Covid-19 sem nunca terem tido Covid-19.
João Júlio Cerqueira e Nuno Silva (texto completo aqui)

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