E está em risco porquê? Porque a ditadura atrai o cidadão comum na razão inversa da insegurança. Como sempre acontece nos países pobres, os portugueses põem a segurança acima de qualquer valor. Daí a atracção pelo funcionalismo (inamovível) e a desconfiança do emprego privado (por definição, imprevisível). Mas também, e apesar de tudo, pela ordem tradicional. O indígena, que vive na miséria ou perto dela, precisa de acreditar na estabilidade da família, do emprego, da reforma e da assistência médica; precisa de ver os filhos bem “encaminhados”; e os ladrões na cadeia. Numa palavra, precisa de acreditar na autoridade e hoje basta ligar a televisão para constatar que a autoridade democrática dia a dia se desfaz. O Estado faliu, os banqueiros faliram (ou andam lá perto), o desemprego continua, as criancinhas do 5.º ano de escolaridade vão ser instruídas nas realidades do aborto e da contracepção, o PC e o Bloco proclamam a urgência de tornar Portugal numa espécie de Albânia e o governo vive da mão para a boca. No meio disto, naturalmente, o cidadão treme e, no fundo, começa a pensar que a sua paz de espírito vale um pouco de tirania. Não vale. Mas cada vez mais parece que vale. Salazar não chegou onde chegou, senão por isso. E não lhe custou muito.
Pode continuar a ler o diário de Vasco Pulido Valente,hoje no OBSR
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