Essa gente é dada a coincidências e misticismos. Durante anos, as exactas personalidades que querem exilar o “eng.” Sócrates em Timbuktu ou na cadeia também afirmaram em uníssono a sua indignação pelo martírio do ex-governante. À época, leia-se até há duas semanas, o “eng.” Sócrates era o maior estadista português depois de Viriato, um portento cuja competência e cuja “dinâmica” (?) inspiravam o ódio de “neoliberais”, a luxúria da imprensa sem escrúpulos e a perseguição a cargo de magistrados com “agenda”. Cada sólido indício de que o nível de vida do homem fugia um bocadinho ao nível dos seus rendimentos merecia discursos épicos acerca do carácter sagrado do segredo de justiça. Os “empréstimos”, os apartamentos, os amigos, as escutas, as férias, os familiares, os contactos, os compadres, os tráficos, as mulheres, as contas, as roupas, os levantamentos, os motoristas e os carros não suscitavam qualquer suspeita, só a certeza da má-fé dos inimigos do “eng.” Sócrates.
Há ainda a hipótese, meramente académica, de essa gente não acreditar em nada, excepto na disposição do eleitorado para acreditar em tudo – principalmente na inexistência de um sistema criminoso e profundamente corrupto que transcende o PS, embora prefira o PS no poder por facilidades logísticas e vocação. Ou que o linchamento brusco do “autor” de “A Tortura no Mundo” e de alguns dos respectivos ministros não é o típico sacrifício de uns comparsas a fim de salvar a quadrilha. Nas imortais palavras do dr. Marques Mendes, um símbolo justo dos bandos em questão, há o PS “mau” do “eng.” Sócrates, e o PS “bom” do dr. Costa. Ou de quem lá estiver no momento, a coordenar os arranjinhos e a “estabilidade”. Se o “eng.” Sócrates abrir a boca e perturbar ambos, prometo comprar-lhe a obra completa. Lê-la é outra história.
(excertos do artigo de Alberto Gonçalves, hoje no OBSR)
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