José Manuel Fernandes fez, no Observador, o melhor resumo do caso do lar de Reguengos: "A morte de 18 seres humanos em Reguengos sobressaltou menos o país do que a morte dos animais em Santo Tirso."
Isto diz tudo sobre o estado da nação. E é com base nesta insensibilidade pela vida humana, sobretudo dos mais fracos e desprotegidos, que o primeiro-ministro afirma que as críticas à ministra Ana Mendes Godinho são polémicas artificiais e que entidades ligadas à Igreja vieram, pressurosas, defender essa "dedicada militante católica" que mostrou a insensibilidade que está à vista de todos e que esperou três semanas, depois dos primeiros avisos e após 16 mortes, para começar a fazer perguntas.
Em vez de polémicas artificiais, prefiro pensar que há ministros artificiais. Ana Godinho é um "case study" nesse género. Passou de andar à boleia da mina do turismo em tempo de vacas gordas para o desagradável mundo real onde a miséria se revela. A rápida resposta do primeiro-ministro neste caso comprova como gosta pouco de críticas e prefere o silêncio, como bem recentemente se viu no caso da alteração da periodicidade dos debates parlamentares. As palavras incomodam imenso, como se sabe.
O pensamento de António Costa sobre as críticas chega longe, dentro do Estado. Por exemplo, a direcção da PSP foi ainda mais longe e resolveu processar um jornal por um "cartoon" satírico no qual surgiu uma farda daquela polícia numa manifestação racista; azar dos Távoras, poucos dias depois, uma página do Facebook ligada a elementos da Polícia de Intervenção, pertencentes à PSP, criticava a decisão de ser dada protecção policial a activistas e políticos ameaçados por uma organização racista.
A decisão de processar o conteúdo humorístico foi a primeira atitude pública de intervenção na sociedade da equipa do novo diretor nacional da PSP, Magina da Silva, nomeado pelo Governo de Costa em Janeiro passado. Com um responsável policial que não suporta o humor e não vê o que se passa em casa e com um primeiro-ministro que elogia uma ministra da Solidariedade insensível a mortes, estamos bem desgovernados.
Manuel Falcão, J Negócios
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