Honesto individualmente, corrupto coletivamente
A história se repete continuamente, não apenas no tempo, mas em diferentes lugares: Pessoas que acusavam outras de corrupção mostram-se tão ou mais corruptas tão logo passam a ter poder sobre a riqueza da coletividade.Os economistas estudam há muito tempo o comportamento ético das pessoas por meio de testes simples de laboratório, como o "jogo do ditador", em que uma pessoa recebe uma pequena quantia em dinheiro e deve escolher se dará parte ao seu parceiro desconhecido de jogo.
Normalmente, a maioria das pessoas doa um pouco de recursos, embora não recebam nada em troca, sugerindo que temos um senso intrínseco de justiça.
Na vida real, porém, a injustiça é comum, variando desde funcionários de escritório que deixam de contribuir com sua parte dos lanches comunitários até fraudes financeiras em grande escala e direcionamento de recursos públicos para políticos aliados, sem critérios de justiça social.
Gostamos de pensar que as pessoas que trapaceiam dessa maneira são uma minoria, ou mesmo que as pessoas que não se importam com os outros são atraídas por carreiras nas quais possam tirar vantagens próprias.
Mas será que é assim mesmo, que o "mal" está em alguns, que costumamos chamar de corruptos, ou será que há pequenos males em cada um de nós, cada um podendo se comportar de maneira não ética se tiver a oportunidade?
Para investigar a questão de modo melhor embasado, Carlos Alós-Ferrer e colegas da Universidade de Zurique (Suíça), projetaram um novo jogo monetário, que eles batizaram de "Grande Ladrão", em que qualquer ação injusta afeta não apenas um outro jogador, mas um número maior de pessoas.
Os pesquisadores começaram pedindo a grupos de 32 pessoas que jogassem o jogo do ditador e dois outros jogos semelhantes, em pares, e os resultados foram os mesmos vistos tradicionalmente, sendo que a maioria das pessoas agiu generosamente.
Metade do grupo foi então questionado se gostaria de guardar para si parte dos ganhos da outra metade: Eles poderiam pegar metade da quantia, um terço, um décimo ou nada, sem que fossem identificados. A equipe repetiu esse processo com 640 pessoas no total - é importante notar que havia valores reais em dinheiro envolvidos (200 francos, em média), que os voluntários podiam efetivamente levar para casa.
Dos 320 indivíduos que receberam a opção de roubo, 98% pegaram pelo menos parte do dinheiro e 56% pegaram a metade.
Os resultados mostram que as pessoas - eram as mesmas pessoas nos dois casos - podem ser justas com os indivíduos e egoístas e desonestas com os grupos maiores, disse Alós-Ferrer: "Os seres humanos são perfeitamente capazes de exibir os dois tipos de comportamento."
E o teste também indica que os pesquisadores precisam ajustar seus experimentos: Como as pessoas podem agir de maneira diferente na vida real e no laboratório, ou quando interagem individualmente ou em grupo, é necessário ser mais criativo para bolar experimentos que realmente cheguem a conclusões realistas, diz a equipe.
Autores: Carlos Alós-Ferrer, Jaume García-Segarra, Alexander Ritschel
Publicação: Nature Human Behaviour
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