A convicção de Eanes, de que os portugueses “mesmo quando parece que votaram mal, em geral votaram bem”, é mais que uma aparente banalidade bem-intencionada, é a reafirmação de que há um país sábio para além dos círculos cada vez mais fechados das rarefeitas esferas do poder - ministros, deputados, autarcas, altos-funcionários do Estado nomeados pelo partido no poder, banqueiros e empresários com dinheiro e influência, comentadores encartados e jornalistas.
(José Júdice, DN)
De que há um país feito de gente anónima, pessoas que trabalham, que estudam, e de uma faixa cada vez maior que deixaram de trabalhar e dependem do Estado - pela Segurança Social, pelo Serviço Nacional de Saúde, pelas autarquias - para terem o que comer, para terem um tecto debaixo do qual dormir, e para terem quem os trate na doença e na necessidade. Mas que dependem também, e cada vez mais do apoio privado, venha ele das muito antigas IPSS, como misericórdias e tantas outras patrocinadas pela Igreja Alimentar quem tem fome, abrigar quem não tem tecto, socorrer quem não tem auxílio, defender quem não tem força. Pobres, quase dez por cento da população, velhos, quase um quarto, e imigrantes, quase dez por cento dos que vivem em Portugal - explorados, olhados com desconfiança e mal-tratados com sobranceria e frieza burocrática pelos serviços públicos que os deviam acolher e proteger.
A esquerda engordou o Chega. Agora foi comida por ele - O sentimento anti-sistema é tão profundo que o Chega repolitizou o país, com a abstenção mais baixa destes 30 anos. Isso confere a Ventura uma dupla legitimidade para se impor à mesa dos grandes. (João Miguel Tavares, Público)
À hora a que escrevo este texto ainda não é claro se é a AD ou o PS quem vence as eleições; mas à hora a que escrevo este texto já é claro que ambos foram politicamente derrotados pela impressionante ascensão do Chega. André Ventura andou perdido na campanha eleitoral e limitado pelo “não é não” de Luís Montenegro, mas aquilo que os resultados demonstram é que criou uma base eleitoral fortíssima, socialmente transversal e que atravessa o país de norte a sul e do continente às ilhas.
Sem comentários:
Enviar um comentário