A cultura europeia brotou do encontro entre a razão e a fé cristã. Hoje, a pretensão de neutralidade impede-nos de reconhecer quem somos. Temos de nos reencontrar com o que forjou a nossa civilização
(...)As nossas raízes mergulham fundo no passado. Fomos marcados pela modernidade, mas não nascemos com ela. (...)
Filhos, enfim, de um entrelaçamento frutífero de fé e razão, que não se negam mutuamente, mas caminham lado a lado, reforçando-se uma à outra e podando-se reciprocamente dos excessos.
O tempo cindiu-se ao meio – antes de Cristo e depois de Cristo – e o mundo mudou para sempre. Aos Gálatas, Paulo anunciava: «não há judeu nem grego; não há escravo nem livre; não há homem e mulher, porque todos sois um só em Cristo Jesus» (Gl 3, 28). Todos os combates pela igualdade, mais ou menos bem direccionados, são herdeiros deste clamor do Apóstolo.
Claro que a Europa, hoje, em 2024, se transformou num caldo de culturas bastante mais complexo. Recebemos muita gente, vinda de muitas proveniências, e a nossa própria certeza acerca de quem somos parece esbater-se na névoa da pós-modernidade. (...)
Às vezes, achamos mesmo que a convivência com as outras culturas fica mais fácil e mais justa quando tornamos tudo neutral, asséptico, desprovido de qualquer carga religiosa. Esta abordagem, porém, tem vários problemas. Um deles é que não nos é possível, por muito que o tentemos, ocultar quem somos. A sombra do passado surpreende sempre os mais incautos e espreita por entre as frestas das mais improváveis paredes. (...)
Filhos, enfim, de um entrelaçamento frutífero de fé e razão, que não se negam mutuamente, mas caminham lado a lado, reforçando-se uma à outra e podando-se reciprocamente dos excessos.
O tempo cindiu-se ao meio – antes de Cristo e depois de Cristo – e o mundo mudou para sempre. Aos Gálatas, Paulo anunciava: «não há judeu nem grego; não há escravo nem livre; não há homem e mulher, porque todos sois um só em Cristo Jesus» (Gl 3, 28). Todos os combates pela igualdade, mais ou menos bem direccionados, são herdeiros deste clamor do Apóstolo.
Claro que a Europa, hoje, em 2024, se transformou num caldo de culturas bastante mais complexo. Recebemos muita gente, vinda de muitas proveniências, e a nossa própria certeza acerca de quem somos parece esbater-se na névoa da pós-modernidade. (...)
Às vezes, achamos mesmo que a convivência com as outras culturas fica mais fácil e mais justa quando tornamos tudo neutral, asséptico, desprovido de qualquer carga religiosa. Esta abordagem, porém, tem vários problemas. Um deles é que não nos é possível, por muito que o tentemos, ocultar quem somos. A sombra do passado surpreende sempre os mais incautos e espreita por entre as frestas das mais improváveis paredes. (...)
O sistema liberal em que vivemos só concede direito de cidadania ao indivíduo e à grande Humanidade. Lida mal com o particularismo, com os corpos intermédios, com a nação, com o bairro, com a terra, com o sotaque, com o costume local, com o compasso pascal e a procissão de Corpo de Deus, os sinos a marcar as horas do dia e as figuras tradicionais de autoridade. Mas, às vezes, a pretensão da neutralidade desfigura-nos a identidade e impede-nos de reconhecer quem somos. (...)
Deste modo, podemos acabar como Peter Schlemihl, o protagonista do conto de Chamisso que, em troca de prosperidade e progresso, vende ao diabo a própria sombra e vem a tornar-se num homem inseguro, envergonhado e solitário, sem rasto e sem memória, para sempre desamparado.
Neste tempo de Páscoa, tempo de morte e de ressurreição, tempo de triunfo e de novos começos, faremos bem em cuidar da nossa sombra e em reencontrarmo-nos com as grandes verdades que forjaram a nossa civilização e que permanecem, hoje mesmo, tão vivas e eficazes como há dois mil anos. Quem não sabe de onde vem não pode saber onde está, nem, muito menos, para onde deve ir. (exertos do texto de António Pedro Barreiro, OBSR)
Deste modo, podemos acabar como Peter Schlemihl, o protagonista do conto de Chamisso que, em troca de prosperidade e progresso, vende ao diabo a própria sombra e vem a tornar-se num homem inseguro, envergonhado e solitário, sem rasto e sem memória, para sempre desamparado.
Neste tempo de Páscoa, tempo de morte e de ressurreição, tempo de triunfo e de novos começos, faremos bem em cuidar da nossa sombra e em reencontrarmo-nos com as grandes verdades que forjaram a nossa civilização e que permanecem, hoje mesmo, tão vivas e eficazes como há dois mil anos. Quem não sabe de onde vem não pode saber onde está, nem, muito menos, para onde deve ir. (exertos do texto de António Pedro Barreiro, OBSR)
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