França mostra o que se segue: a luta contra as alterações climáticas cai em cima de todos mas é particularmente dura na classe média-baixa, a base do que ainda se pode designar genericamente por trabalhadores mal remunerados, desempregados e o restante conjunto difuso dos excluídos do "sucesso".
Trata-se de um segmento enorme onde há muita ira acumulada e capacidade de atuação social pela violência. Estas pessoas têm de ser tratadas com particular proteção porque merecem essa dignidade. Mas, igualmente, porque serão o primeiro pelotão de combate às políticas de transformação contra as alterações climáticas, questão tão crucial que não pode ser adiada.
Parar as emissões de carbono tem um preço social altíssimo.
Além disso, todos os centros de negócio da indústria do petróleo e automóvel ajudam na manutenção do paradigma carbónico - ninguém deixa morrer um negócio desta escala épica sem dar luta.
Ainda por cima, o transporte individual é quase a única opção fora dos grandes centros, tornando a vida dura e cara. Não ter acesso a transportes públicos - numa era de custos crescentes por emissões de carbono - é uma forma importante de pobreza que deve ser reconhecida.
A crise ambiental é transversal a todos os países que acreditem na ciência. Mário Centeno também é dos que acha que as emissões são globais. O que pensou o ministro sobre o tema quando apresentou o Orçamento do Estado em outubro? Propôs baixar o imposto sobre a gasolina, tornando-o mais próximo do gasóleo. É uma medida idêntica à de Macron mas inversa: em vez de querer somar mais impostos, diminuiu receita. Por isso, o presidente francês foi acusado de demagogia - embora todos saibamos que a solução não passa apenas por se ir transferindo o consumo do gasóleo para gasolina por razões ambientais. É preciso diminuí-las a todas. E a única forma é subir o preço. Portanto, Macron está certo no diagnóstico. Mas fazê-lo sem um tecido social que consiga ir trabalhar sem automóvel não é ainda realista.
(Excertos do artigo de Daniel Deusdado, DN)
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