Quem nunca percebeu a felicidade no Sol a atravessar a copa de uma árvore terá tanta dificuldade de entender este texto quanto aquele que nunca sentiu ressoar em seu corpo os gritos da multidão a reivindicar direitos. É da natureza da felicidade exigir uma vida de pensamento. Por esse motivo, em vez de correr atrás de uma simples definição, o que a filosofia faz é pensar as condições que fazem da felicidade menos uma conquista do que a constância que possibilita o próprio pensar. Ou seja, a felicidade não está fora do pensamento, como a cenoura que faz o burro caminhar; ao contrário, a filosofia e a felicidade se confundem, como virtudes de uma vida que toma a si própria nas mãos.
Apesar de fundamental, a felicidade é uma ideia impossível de representar: ela surge, aqui e ali, vez ou outra, um tanto imprevisível, nos mais diversos modos de vida. Ou seja, não há imagem capaz de aglutinar em uma só perspectiva o que se apresenta em um florescimento tão variado. Não há nada menos filosófico do que a tentativa de capturar a felicidade em uma receita: nenhum passo a passo é capaz de representar o movimento de um pensamento que se faz a partir da felicidade, porque sentir-se bem dispensa a ideia.
(LAURO, Rafael. A felicidade não é uma pergunta. Razão Inadequada, 2024.)
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