sábado, 24 de maio de 2014

Insatisfação Absoluta ...


O que me dói 

É que quando está tudo acabado 
Pronto pronto 
Não há nada acabado 
Nem pronto pronto 
Pintou-me a casa toda

Está tudo limpado
O armário fechado
A roupa arrumada
Tudo belo, perfeito.
E no mesmo instante
Em que aperfeiçoamos a perfeição
Uma lasca diminuta, ténue, microscópica,
Não sei onde,
Está começando
Na pintura da casa
E as traças, não sei onde,
Estão batendo asas
E a poeira, em geral, está caindo invisível,
E a ferrugem está comendo não sei quê
E não há jeito de parar.

Millôr Fernandes   

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