Eu hontem passei o dia
Ouvindo o que o mar dizia.
Chorámos, rimos, cantámos.
Fallou-me do seu destino,
Do seu fado...
Depois, para se alegrar,
Ergueu-se, e bailando, e rindo,
Poz-se a cantar
Um canto molhádo e lindo.
O seu halito perfuma,
E o seu perfume faz mal!
Deserto de aguas sem fim.
Ó sepultura da minha raça
Quando me guardas a mim?...
Elle afastou-se calado;
Eu afastei-me mais triste,
Mais doente, mais cansado...
Ao longe o Sol na agonia
De rôxo as aguas tingia.
«Voz do mar, mysteriosa;
Voz do amôr e da verdade!
- Ó voz moribunda e dôce
Da minha grande Saudade!
Voz amarga de quem fica,
Trémula voz de quem parte...»
. . . . . . . . . . . . . . . .
E os poetas a cantar
São echos da voz do mar!
António Botto
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